Gula, a benjamim da família, tem dois anos mas ainda se comporta como uma adolescente. Apesar do seu tamanho (já ultrapassou a matriarca que, por sinal, é bem grande) continua a pensar que se consegue esconder sempre que (e é muito frequente) faz asneira.
Kuka, a matriarca, já conta com 8 anos. Como indica o seu “petit nom”, apesar dos seus 60 kg de puro músculo, é um peluche gigante que faz as delícias das crianças. Já começa a evidenciar alguns sinais do avançar da idade. Tem um feitio de ouro. Este feitio sofreu no entanto algumas alterações quando nasceram os meus filhos. O seu instinto materno levou-a a adoptar a minha prole como se esta fosse dela. A consequência imediata foi uma alteração do seu comportamento quando saímos em família. Como é calma e obediente não puxa a trela, permitindo que sejam as crianças a segurá-la mas, apesar de nunca ter tido um comportamento agressivo, noto que ela sente alguma dificuldade em suportar aproximações de estranhos quando as crianças estão na rua.
Estávamos a passear os cães e os filhos, no local onde vamos praticamente todos os dias. Este local é frequentado por imensas famílias com e sem cães.
O Miguel leva a Gula e as crianças mais velhas. A Susana (3 anos) segura a trela da Kuka que avança vagarosamente à nossa frente.
A Susana, sendo a mais pequena, anda mais devagar. Vamos ficando para trás… Deixamos de ver o resto da tribo. De repente apercebo-me de uma mudança subtil na postura da Kuka. As orelhas movimentam-se. Os pelos na espinha eriçam-se. Sem puxar a trela, coloca-se à nossa direita. Não rosna, mas está tensa.
Tiro suavemente a trela da mão da Susana. Estamos num sítio familiar, mas estamos sozinhas, e não gosto do friozinho que sinto na nuca…
Ouvimos uns ruídos e de repente, vejo a aparecer entre a vegetação um homem que salta o muro de uma quinta abandonada à nossa direita. Tem um aspecto suspeito e pára abruptamente quando nos vê. Instintivamente puxo a Susana para trás e coloco-me à frente dela. A Kuka tem o mesmo instinto e coloca-se entre nós e o estranho. Está totalmente concentrada. O seu peito incha, aumentando o seu porte naturalmente já impressionante. Não há qualquer dúvida quanto ao seu instinto.
- Morde? Pergunta olhando para a Kuka.
Não tenho tempo de responder. Ouço novamente um ruído. Salta mais um indivíduo pelo mesmo local. Quando se depara com o nosso pequeno grupo tenta dissimular o que vejo ser uma mala de mulher debaixo da camisola. Já não restam quaisquer dúvidas….
Estamos todos imóveis a olhar uns para os outros.
Estou irritada por estar nesta situação com a Susana. Tenho raiva por me sentir tão vulnerável. Não quero estar aqui, mas principalmente não quero a minha filha aqui…
Ouço um som desconhecido e apercebo-me que é a Kuka a rosnar. Dá um passo à frente, obrigando os homens a recuar, a aumentar a distância entre nós e eles. Tem o olhar fixo. A sua postura indica claramente a sua intenção. Sinto que ela fará tudo para evitar que qualquer coisa nos aconteça. Visualizo a confusão que seria se eles não recuassem. Ela é muito grande, mas será que nos consegue livrar dos dois sem ser magoada? Sem a Susana se magoar? Sinto um aperto no coração por ver a sua devoção. Não houve um momento de hesitação na sua reacção.
Os homens contornam-nos devagar. Ela acompanha o movimento. Está sempre à nossa frente, colocando o corpo como barreira entre nós e eles.
Começam a recuar e afastam-se. A uma distância segura voltam-se e desatam a correr para longe. Ficamos em silêncio até desaparecerem. Quando deixamos de os ver ajoelho-me ao lado dela. Ainda continua totalmente focada. Demora uns segundos a reagir à minha voz. Quando o faz começa a espirrar, como que para libertar a tensão. Vira-se para nós a abanar a pequena cauda amputada. Procura a Susana e lambe-lhe a cara. Transforma-se instantaneamente no peluche gigante. Apetece-me chorar.
Passado semanas ainda fico com um nó na garganta quando penso neste episódio. Não consigo ultrapassar a sensação de vulnerabilidade extrema nem a revolta que sinto quando penso no que poderia ter acontecido se estivesse sozinha com as crianças… Sinto-me imensamente grata por tê-la como companheira…
A person can learn a lot from a dog, even a loopy one like ours. Marley taught me about living each day with unbridled exuberance and joy, about seizing the moment and following your heart. He taught me to appreciate the simple things - a walk in the woods, a fresh snowfall, a nap in a shaft of winter sunlight. And as he grew old and achy, he taught me about optimism in the face of adversity. Mostly, he taught me about friendship and selflessness and, above all else, unwavering loyalty.John Grogan, Marley and Me
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