No ano passado participei com o meu marido.
Tinha recomeçado a treinar dois meses antes da corrida após três gravidezes, três cesarianas e respectivos e pós-partos (em quatro anos) sem qualquer exercício físico.
É uma corrida muito gira porque decorre no verão, à noite, em plena marginal (cortada ao trânsito) e com imensa gente (3.500 pessoas).
O meu marido ofereceu-se para me acompanhar ao meu ritmo (não sei se será a palavra correcta mas equivale a uma caminhada para ele…).
Dia da corrida.
Apesar da distância, estou confiante. É dada a partida. Não nos deixamos entusiasmar pelo ímpeto inicial e arrancamos. O meu marido marca o passo.
Começo a ficar impaciente ao sermos ultrapassados por literalmente centenas de corredores.
- Não te enerves. Não vês que não sabem correr? Daqui a 2 ou 3 quilómetros já os apanhamos.
Ok. Ele é que sabe. Ele é que é o atleta profissional.
Após uns minutos aponta para um grupo de 3 mulheres 30 metros à nossa frente.
- Elas têm um ritmo lento muito certinho. Vamos acompanhá-las. Tenta manter sempre esta distância.
Reprimo um sorriso. A média de idades do grupinho à nossa frente deve rondar os 50 anos. Por mim tudo bem. Fazemos um ou dois quilómetros atrás delas e depois passamos à frente.
Dois quilómetros à frente já não tenho qualquer vontade de sorrir. O meu marido conversa normalmente, mas já só consigo responder-lhe por grunhidos.
- Viste aquele miúdo que passou por nós? Não deve ter mais que 6 anos!
- hum hum
- Era giro fazermos isto com os mais velhos…
- hum hum
- Estás bem?
- hmmm
Engulo o orgulho…
- Não consigo! Deixa lá as mulheres. Temos que abrandar…
- Ok.
Fico arrasada por deixar o grupinho a afastar-se… (como é que é possível aquelas velh…)
- Não desistas agora…
Continuo a arrastar-me. Mentalmente vou fazendo a conta aos quilómetros que faltam.
Começamos a apanhar alguns dos apressados que passaram por nós no início. Tal como o meu marido previu, estão todos a andar.
A minha confiança aumenta a cada corredor que ultrapassamos.
Estou quase num estado de euforia. A atingir os 4 km e estou bem… Muito melhor que muitas miúdas com metade da minha idade (Ah, ah, ah!!! Eu, com a idade delas…)
O sacrifício do treino valeu a pena…
Sinto um vulto a aproximar-se rapidamente pelo meu lado esquerdo. Fico boquiaberta quando me apercebo que se trata de uma mulher a empurrar um carrinho de bebé. Ela vai ultrapassar-nos. Tento aumentar o ritmo, mas não obtenho resposta das minhas pernas. Mesmo ao nosso lado abranda ligeiramente. Com uma mão abre a mochila que traz pendurada ao carrinho e retira uma garrafa de água que passa ao rebento que vem confortavelmente sentado no carrinho. Fecha a mochila, acelera o passo e afasta-se rapidamente de nós.
- Viste? consigo articular com dificuldade. Viste aquilo? Como é que ela…?
- Não faz mal. Não ligues. Deixa-a ir. Concentra-te na tua prova...
Consegui acabar a prova sem parar.
Mas a minha auto-estima levou um duro golpe...
Este ano estou motivada.
Espero encontrá-la de novo.
Estou mais bem preparada e, com um pouco de sorte, o rebento do carrinho já deve pesar mais uns 5 ou 6 quilinhos…
Não vão ter qualquer hipótese…
"La seule façon d'être suivi, c'est de courir plus vite que les autres."
Francis Picabia
No comments:
Post a Comment